terça-feira, 26 de agosto de 2008

"Mugshots" e afins ou Crónica de um fim de tarde policial.


Steve McQueen, para a posteridade...

Ontem ao fim da tarde lá fui...
Conforme o combinado com quem de direito, às seis em ponto lá estava eu à porta da esquadra da PSP de Guimarães, fumando o meu cigarrinho, antes de entrar para identificar o "marialva" que tinha assaltado os três carros no Largo do Carmo. Permitam-me que vos diga que tive um fim de tarde em cheio!

Mal entrei na esquadra, fui encaminhado para o "guichet" onde se apresentam as queixas, para dar entrada do meu registo como testemunha da ocorrência. Como é normal, registaram-se os mesmos precalços de sempre quando proferi o meu último nome, para variar um bocadinho. Isto de se ter origem britânica tem as suas desvantagens. Ainda por cima quando o nome de família (Aspinall) se confunde facilmente com o nome de um medicamento (Aspirina) ou com uma extensão do nosso Sistema Nervoso Central (Espinal Medula). É realmente uma chatice, e ontem que remédio tive eu senão soletrar o meu nome, letra a letra, à senhora agente que me inquiria. Lá fui dado como testemunha, sendo que fui imediatamente conduzido para o "bureau" de Investigação Criminal cá do sítio. Entrei na dita sala e lá estavam os três (!!!) agentes que me esperavam para recolher o meu testemunho. Três? Realmente é um processo bastante complicado, este de recolher testemunhos. Isto de saber como é que o gajo era, mostrar fotografias e o caraças é mesmo difícil de fazer. São precisos três homenzarrões de um metro e noventa e oitenta e tal quilos de peso para o fazer... enfim... palavras para quê?

Là descrevi o rapaz... estatura média, cabelo claro, pele clara, olhos claros... por momentos pensei comigo mesmo "pá, até eu caibo nesta descrição"! Também me pediram para descrever a roupa que o gajo usava. Para quê, pensei eu, se já passaram três dias... será que o gajo é assim tão porco para não ter trocado de camisola? Às tantas até pode ser, sei lá! Entretanto, lá me puseram a olhar para um monitor de computador, onde faziam um "zapping" entre centenas e centenas de fotografias. O gajo que aí trabalhava passava tão rápido de fotografia em fotografia, que eu duvido que com ele alguém consiga identificar seja quem fôr... enfim... lá passei para as pastas de arquivo, recheadas de "mugshots" de malta que em tempos prevaricou. Fiquei absolutamente parvo... vê-se de tudo, absolutamente! Gente de todas as idades, de todas as raças, de todos os estratos sociais. Desde o jovenzito de boné "à mitra", passando pelo gajo com cara de quem acabou de tomar a dose de cavalo, até ao bêbado que para na esquina da minha rua ao domingo à tarde e, pasme-se, à dondoca da Avenida de Londres, toda vestida de Moschino, com o penteado a apresentar marcas de ter sido puxado recentemente.

Lá encontrei o meleante em questão, numa paasta já antiga, quando o rapaz em questão ainda apresentava um aspecto mais ou menos sadio. De imediato o "inspector" o reconheceu, dizendo tratar-se de um delinquente que costuma arrumar uns carritos aqui e ali. Recolheu a vinheta com o número do processo, e dirigiu-se à sala de arquivo para ir buscar a pastinha que continha (supostamente!) todas as informações relativas ao rapazote. Para meu espaanto e de todos os presentes na sala, incluindo um dos Super-Intendentes, a pasta com o mesmo número da fotografia trazia à frente a fotografia de um velhote que presumo ser de etnia cigana, aí com uns sessenta anos, bigode preto farto e calvo... fiquei parvo... como é que é possível trocarem este tipo de informação?
- "Às bejes acontechem destas coijas" - dizia um outro polícia mais velho que estava sentado no outro canto da sala.
Lá me disseram que não haveria problema, que mais cedo ou mais tarde iriam encontrar o processo certo (tenho as minhas dúvidas, mas pronto, eu finjo que acredito) e que depois me contactariam para identificar novamente o suspeito quando o apanhassem. Fiquei apreensivo... iria eu ter que o identificar assim, in loco?
- "Num che priocupe, home! Aqui é como nos fiurmes amaricanos. Bochê bai púma xala que tenhe um bidro que xó dá pa bere de um lado e indeuntifica o xuspeito."
Fiquei extasiado com tal promenorizada descrição.
De imediato entrou mais um "bófia" pela sala, dizendo alto que era preciso saír. Tinha ocorrido uma violação na freguesia de Brito...
- "Ora fôda-se!" - disse um deles - "hoje só saio daqui depois das oito! Que merda do caralho! Bamos lá!"
Dei-lhes o meu número de telemóvel, mostrei a minha disponibilidade e saí da esquadra, enquanto me questionava acerca da eficácia das nossas forças de segurança, tal era a desordem dos "clichés" de identificação (nome utilizado por eles) que eu tinha visto.

Acendi um cigarro, e fui à minha vida!

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